Escritas 25.08.01 - PARA ALÉM DOS ESPELHOS
- Lu_rsr
- 19 de ago.
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Hoje eu sou a luz do nascer. Os raios que tocam às brisas do oceano. As nuvens que vestem ao dançar dos ventos. As flores que acariciam ao canto dos pássaros. Meu berço, meu abraço, meu amor. Aqui estou. Nunca só, nunca isolada, nunca desamparada. Na fluidez da energia que nos tece em mundos, eu respiro, eu sinto, eu vivo. Aqui, eu encontro. Aqui, eu toco. Aqui, eu sigo.
Na dispersão, eu me perco, me confundo, mergulho no deslumbre da singularidade. No conglomerado, eu me encontro, me inspiro, voamos ou sedimentamos em desafios de um transformar. Somos areias e sementes, diversas e infinitas. Entre cores, formas, aromas, texturas, posso isolar ao meu movimento? Somos energias vitais, vozes celestiais, nevoas incandescentes.
Breus, sombras, obscuridades me acolhem, me acalmam, me regulam. Penetram nos trajetos tumultuados, nos pulsos ofuscantes, nos murmúrios desconcertantes. Solicitam atenção ao nosso estado. Uma lembrança de que o movimento não me pede regras, nem a minha entrega, mas o desprendimento do que nos ilude. Evocam a presença que nos une, nos transforma, nos nutre.
Eu sou dia tanto quanto sou noite. Eu sou singular tanto quanto sou plural. Eu sou passado tanto quanto sou futuro. Eu sou meio tanto quanto sou finalidade. Para além dos olhos, da imagem, do material, me chamam, me ouvem, me encontram. Na carícia do espinho, a rosa me colore. Nós somos a irmandade da lucidez. Nós somos o cantar da percepção. Nós somos o fruto deste instante.
Ao mesmo tempo, criamos ao mundo dos reflexos. Bases de espelhos e espelhados. Sem raízes, sem afetos, sem permeabilidades. Desde o primeiro choro, nos apresentam às luzes que nos atravessam, aos movimentos que nos hipnotizam, às velocidades que nos paralisam. Quando a busca é pelo conto dos olhos que sorriem ao me ninar. Quando a busca é pelas luzes do amor e do amar.
Em seu lugar, encontramos às inovações de brilhos e miragens. Prazer ou desejo? Encantos que nos fragilizam, nos dissolvem na arenização dos Pampas. Nos desconectam. Esquece do ofuscamento. Esquece da passagem do tempo. Esquece do contexto. Passa a admirar aos olhos que nada sentem. Passa a acreditar na visão como matriz da verdade. Passa a ensaiar visões da escalabilidade.
Será?
Olhemos para nosso reflexo. Ajeita à luz, ajusta ao ângulo, monta ao cenário. Distorce, fragmenta, condena a quem o observa. Por quê? Não sou eu constituinte da sua existência? Para além da imagem de um espelho herdado, eu me encontro. Para além da voz de um discurso ensaiado, eu me disponho. Para além da energia de milhões de anos decompostos, eu me inspiro.
Quem transforma as suas sombras em beijos do Sol e abraços da Terra? Quem transforma aos seus caminhos em jornada de cores e desafios de aprendizagem? Quem transforma as suas palavras em toques de emoção e danças de sentimentos? Quem transforma aos seus feitos em respiros de respeito e águas de reconhecimento? Em nossa união, compreendemos à essência do existir.
Espelhos e espelhados nos afastam da verdade. Doces ilusões ou cruéis preferências? Em simplificações de sentidos, relações, percepções, escolhemos. Escolhe ignorar às histórias silenciadas. Escolhe se isolar dos demais seres e elementos. Escolhe se apartar da nossa integridade. Medo do futuro, dos afetos, da verdade? Ou sacrifício para sustentar ao brilho das parcialidades?
A cada segundo, escolhe a versão que melhor lhe agrada, que melhor lhe atende, que melhor lhe traz vantagens. Como se o Tempo apagasse o que você descarta. Como se o sol optasse pela sua intensidade. Como se o horizonte dominasse ao seu próprio contorno. A mim, destina o desdém de um outro alguém. Quem somos neste reflexo? Nesses espelhos que nos repartem?
Como quer que eu conecte suas palavras a imagens, suas conquistas a heróis, seus feitos a entidades? Quando reduz as minhas sensibilidades, dissolve aos meus pensamentos, ignora as minhas emoções. Sob suas escolhas, extrai as minhas parcialidades. Ao passo que engole às lâminas da nossa repartição. Por que me oculta de suas visões, de suas passagens, de seus contextos?
Você me vê como um. Eu te vejo como infinitos.
Nos secam a retina, exaurem aos nossos receptores, estinguem aos nossos sentidos. Em sua superfície, eu vejo ao vulcão adormecido. Em sua atmosfera, eu vejo ao amor desfalecido. Em suas lágrimas, me encontro, respiro, vivo. Podemos nos fragmentar, nos distorcer, nos perder. Nos descolorir num inverno desvirtuado. Ou podemos nos unir, nos respeitar, nos encontrar na essência do nosso ser.
A Paz não está em mim, nem em você, mas em nós. Para além das partes, somos horizontes, primaveras, vibrações. Energias que ressoam, se movem, se entrelaçam. Para o Universo, somos passeios do artesanato, pontes do indeterminado, redes da transformação. Ou simples elos da efemeridade. Você me vê nessa modernidade ou condena as minhas partes?
Eu estou na alegria do descobrir, na curiosidade do observar, na surpresa do aprender. Feche aos olhos e se abra para os demais sentidos. Mergulhe na nossa integridade. Floresça na nossa sinergia. Sinta ao movimento da nossa eternidade.
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Escrito por Lu_rsr